O Norte do Brasil ameaçado – devaneios de um escritor frustrado

Explicação

Produzi este texto há uns anos atrás, baseado no relato de um fictício estudante que esteve aqui em Roraima e constatou o quadro sintetizado abaixo. Foi devaneio mesmo. Mas achei um desafio literário para pretenso escritor sem qualquer talento para tal. Portanto, sugiro ao leitor que resolva perder seu tempo com este arremedo, que o faça apenas como diversão. Se conseguir extrair algumas rizadas, já me dou por satisfeito. Chamo atenção para a referência ao amigo Flávio Aguiar – quem realmente me repassou o texto do suposto estudante do Sul. Espero que não me cobre royalty pelo uso indevido do seu nome. 

Ficção ou fantasia?

Um pássaro serpenteia sobre sua cabeça. O calor do sol abranda-se com a brisa que corre fresca na manhã de inverno. O jovem cientista observa o trafegar de formigas aos seus pés. Tão atentas ao trabalho que estão, esquecem-se de ferroá-lo. “Para quê?” pensa ele. “Só iriam perder tempo e correr risco de vida”.

Alemão, não conhece o português, o uapixana, o macuxi. Domina o inglês, o francês, o italiano e o espanhol, além de seu idioma pátrio. Sempre soube que a Amazônia é patrimônio da humanidade. Curiosamente, encontrara em alguns arquivos antigos, na biblioteca da universidade, constatação de que há mais de cem anos a região pertencera, na sua maior territorialidade, ao Brasil. Mas parece que esta parte do passado o mundo não quer lembrar – nem mesmo o Brasil. A partir daí teve a ideia de desenvolver sua tese de doutorado sobre o processo de dominação estrangeira da Pan-amazônia.

Chamara-lhe atenção a forma sorrateira como chegaram ao objetivo: tratados internacionais, serviço de inteligência, espionagem, tudo tão bem guardado e cujos arquivos só lhe têm sido revelados por conta de propinas, subornos, que é obrigado a oferecer em troca das informações. “Foi um monumental trabalho de engenharia!” – conjectura.

Um desses documentos conseguidos com euro é a narrativa de uma pessoa que, supostamente, esteve na Amazônia em 2003. Chamava-se Silvio Drummont. Parece que era estudante do Sul do País e visitou cidades que ainda não conseguiu definir onde se situavam. Os nomes são engraçados: Manaus, Boa Vista, e outra com nome mais esquisito ainda: Mucajaí. O título do documento é “O NORTE DO BRASIL AMEAÇADO”, que por si já denota o ânimo do autor. As partes do relato que mais lhe chamaram a atenção são relativas a Roraima:

“Conversei com algumas pessoas (…) desde engenheiros até pessoas com um mínimo de instrução. Pra começar, o mais difícil de se encontrar por aqui é roraimense! (…) Portanto, falta uma identidade com a terra. Aqui não existem muitos meios de sobrevivência: ou a pessoa é funcionária pública, e aqui quase todo mundo o é, pois em Boa Vista se concentram todos os órgãos federais e estaduais de Roraima (…). Se não for funcionário público a pessoa trabalha no comércio local ou recebe ajuda de programas do governo. Não existe indústria de qualquer tipo.”

“Pouco mais de 70% do território roraimense é demarcado como reserva indígena, portanto, restam menos 30%, descontando-se os rios e as terras improdutivas (que são muitas!), para se cultivar a terra ou para a localização das próprias cidades. Na única rodovia que existe em direção ao Brasil (liga Boa Vista a Manaus, cerca de 800 km) existe um trecho (…) por onde você só passa entre 6 horas da manhã e 6 horas da tarde! Nas outras 12 horas a rodovia é fechada pelos índios (com autorização da FUNAI e dos americanos) para que os mesmos não sejam incomodados! Detalhe: você não passa se for brasileiro, mas o acesso é livre aos americanos, europeus e japoneses!”

“Desses 70% de território indígena, diria que em 90% dele ninguém entra sem uma grande burocracia e autorização da FUNAI! Detalhe: americanos entram na hora que quiserem! Outro detalhe: se você não tem uma autorização da FUNAI, mas tem a dos americanos, então você pode entrar! A maioria dos índios fala a língua nativa, além do inglês ou francês, mas a maioria não sabe falar português. Dizem que é comum, na entrada de algumas reservas, encontrarem-se hasteadas bandeiras americanas ou inglesas!”

“É comum se encontrar por aqui americanos tipo “nerds” com cara de quem não quer nada, que vieram caçar borboleta, joaninha, e catalogá-las, mas, no final das contas, pasmem, se você quiser montar um empresa para exportar plantas e frutas típicas como cupuaçu, açaí, camu-camu, etc., (…) ou componentes naturais para fabricação de remédios, pode se preparar para pagar royalties para empresas japonesas e americanas que já patentearam a maioria dos produtos típicos da Amazônia!”

“(…) É… os americanos irão acabar tomando a Amazônia brasileira. (…) Reproduzo a resposta de uma senhora simples que vendia suco e água na rodovia, próximo de Mucajaí: “Irão não meu filho, tu não sabe mas tudo aqui já é deles! Eles comandam tudo! Você não entra em lugar nenhum porque eles não deixam! Quando acabar essa guerra, aí eles virão pra cá, e vão fazer o que fizeram no Iraque, quando determinaram uma faixa para os curdos onde iraquiano não entra! Aqui vai ser a mesma coisa.”

“(…) O pior é que, segundo a ONU, nação é um conceito de soberania, e as áreas demarcadas têm o nome de nação indígena, o que pode levar os americanos a alegarem que estarão libertando os povos indígenas. Fiquei sabendo que os americanos já estão construindo uma grande base militar na Colômbia, bem próximo da fronteira com o Brasil, numa parceria com o governo colombiano, com o pseudo-objetivo de combater o narcotráfico (…).”

É a partir deste documento do século XXI, enviado por e-mail de um doutorando em robótica da Universidade de São Paulo chamado Flávio Aguiar, a um amigo nativo chamado Assis, que o jovem Rudolf von Ihering pretende constituir as hipóteses de sua tese.

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