População de Pacaraima expulsa imigrantes. Comerciantes venezuelanos fecham as portas alegando insegurança com o retorno dos patrícios e pedem socorro ao Exército e à Guarda Nacional bolivariana

O comerciante Raimundo da Churrascaria foi gravemente ferido com várias pauladas durante o assalto a sua residência.

No último sábado, 18 de agosto/2018, os moradores de Pacaraima, cidade fronteiriça do Brasil com a Venezuela, expulsaram cerca de 1,2 mil imigrantes venezuelanos, segundo o Exército brasileiro, ou 3 mil, conforme os manifestantes. As imagens são comoventes. O estopim foi a tentativa de latrocínio cometida por quatro venezuelanos, segundo a população, contra o comerciante Raimundo da Churrascaria e sua família. Raimundo ficou gravemente ferido e foi transferido para o Hospital Geral de Roraima, em Boa Vista. O ato dos brasileiros chegou a movimentar a Guarda Nacional Venezuelana, conforme as imagens.

Com a volta dos imigrantes, os comerciantes de Santa Elena do Uairén, primeira cidade do lado venezuelano, resolveram fechar as portas por tempo indeterminado. Em áudios divulgados nas redes sociais, os comerciantes se mostram apavorados com o número de patrícios – três mil. Dizem que a situação chegou fora de controle e pedem ajuda à Guarda Nacional e ao Exército venezuelanos. Ao que se sabe, dentre os refugiados expulsos de volta, há criminosos que foram soltos devido à falta de comida nas prisões. Os imigrantes entram no Brasil sem qualquer triagem ou exigência de documentos, inclusive certidão de antecedentes criminais.

 

 

 

Venezuela fome
FOME: esta é a palavra de ordem na Venezuela. Os protestos contra a política social-bolivariana são cruelmente reprimidos pela Guarda Nacional, Exército e pelas milícias. A ordem é atirar pra matar. Este quadro tem provocado um êxodo populacional – leia-se: mão-de-obra especializada e, sobretudo, dos jovens -, o que acarretará danos incalculáveis no longo prazo. Foto: REUTERS/Christian Veron/Estadão.

Pelas ruas, lojas, drogarias e bares de Boa Vista, tenho visto todos os tipos de venezuelanos: com pastas de plástico debaixo do braço perguntando onde fica a delegacia do Trabalho; com enxadas nas costas pedindo pra capinar quintais, vendendo bugigangas nos semáforos; mulheres com bebês nos braços mendigando, crianças indígenas venezuelanas pedindo esmolas nos sinais, ladrões e assassinos mal-encarados sendo presos pela polícia, homens mal-educados agindo como animais; mulheres, homens e crianças vagando pela ruas com o desalento no semblante e o desespero nos olhos. Enfim, a invasão venezuelana inseriu em Roraima, um Brasil que o Brasil desconhece, uma nova e triste realidade, fruto da vizinha revolução bolivariana.

Crinaças venezuelanas de etnias indígenas pedem esmola nos semáforos. Foto: Assis Cabral

A questão imigratória em Roraima tem acendido o debate nacional. Xenofobia intolerância são os termos mais utilizados contra quem ao menos questiona o processo migratório. Desde moradores, passando por brasileiros que sequer sabem onde localizar o Estado no mapa do Brasil, até colunistas e autoridades internacionais, que juram ser o espanhol o idioma nacional.

Curiosamente, percebo que há muito de idealismo em tais manifestações “anti-xenófobas”, justamente por parte de pessoas com discurso  claramente de esquerda, o que nos parece um contrasenso, já que Marx usou como instrumento o materialismo histórico e dialético – embora na origem fosse fortemente influenciado por Hegel, cuja dialética era idealista.

Ora, a reação do povo de Pacaraima é fruto da experiência histórica que têm vivido nos últimos anos, e não o produto de uma idealização filosófica, como a Lei de Migração e a Constituição de 1988, que ideologizam “a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações” – conf. o parágrafo único, art. 3° da CF/88. Vimos acima que nem mesmo os próprios venezuelanos, comerciantes residentes em Santa Elena, pretendem tais laços ideais de fraternidade com os seus patrícios, temendo por suas seguranças pessoal e patrimonial.

O venezuelano Cristian Alexis Graterol Cabello foi condenado a 13 anos e quatro meses de prisão por desferir 17 facadas no abdômen de um empresário que, antes, o abrigara por 40 dias. A intenção era matá-lo para roubar seus pertences. Felizmente a vítima sobreviveu. Foto: divulgação internet.

Eu mesmo tenho escrito artigos e publicado postagens em redes sociais sobre o drama que se desenrola por aqui, o que me tem resultado em severas críticas e até ofensas pessoais. Mas o fato é que não critico a imigração, mas sim o processo imigratório da forma como está se dando. Hoje o estado de Roraima, mais do que nunca, é a latrina do Brasil, cuja população sofre o evidente e reiterado descaso do Estado Nacional.

O que se pretende, e isto fica bem claro no debate que se avoluma nas redes sociais e agora começa a ganhar as ruas, é o estabelecimento de critérios óbvios e necessários para o ingresso de imigrante no Brasil, seja venezuelano, haitiano, cubano ou estadunidense: se por um lado é preconceito imaginar que todo e qualquer imigrante é um bandido em potencial, por outro é absoluta ingenuidade, ou maldade de caso pensado, ter por princípio absoluto de que todos são trabalhadores de boa índole fugindo da fome e só  querem acolhimento temporário até que se integrem ao mercado de trabalho nacional.

É óbvio, pois, que dentre os milhares que buscam acolhimento temporário em face de uma situação excepcional, há aqueles que no país de origem mesmo já infernizavam os seus patrícios, e agora estão por aqui, prejudicando-os do mesmo modo, na medida em que continuam cometendo seus crimes, desta feita, não apenas contra brasileiros, mas contra os mesmos venezuelanos de índole ordeira e trabalhadora que atacavam em terras de Bolívar.

Josué Miguel: 34 anos. Na Venezuela executava trabalhos braçais como pedreiro, serralheiro e pintor. Em Boa Vista há quatro meses, vende guardanapos de pano nas ruas. Educado e atencioso, se pergunta “como um homem conseguiu destruir um país” – referindo-se a Nicolás Maduro. Mas questionado quanto a Chaves, ficou mudo. Foto: Assis Cabral

Há três semanas dois venezuelanos estiveram na minha casa. Fizeram uma faxina: capinaram o terreno e lavaram a área de serviço e lazer. Educados, crentes, pacíficos, tranquilos. Paguei o preço cobrado, que foi um preço justo. Vou chamá-los para outros serviços. Mas nesta primeira vez só os contratei por indicação da vizinha, onde já prestam serviço há algum tempo.

Tenho tomado conhecimento através da imprensa que juízes têm liberado venezuelanos nas audiências de custódia, após o cometimento de “delitos de menor potencial ofensivo”, como roubo de celulares, bicicletas e comércios. O que dizer sobre uma situação dessas? Que os magistrados estão corretos, uma vez que será pior para a sociedade o contato desses elementos, sem antecedentes criminais em estado de necessidade, com os detentos do sistema prisional? Tenho profundas dúvidas sobre a eficácia deste raciocínio. Primeiro porque não se exige certidão de antecedentes para o ingresso no País. Desta forma, os mais perigosos bandidos podem cruzar a fronteira saídos dos presídios venezuelanos – e, de fato, é o que está acontecendo. Na venezuela as autoridade estão libertando prisioneiros condenados por não ter mais como alimentá-los.

E, enfim, o que creio ser de maior gravidade: a política de migração estabelecida com a Lei n. 13.445/2017 tem um forte tom ideológico que, no caso concreto, tem como objetivo generalizar a revolução socialista pela América Latina. Mas este é tema para um próximo artigo.

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