O estopim da Primeira Guerra foi um assassinato que, em si, não teria o condão de promover um conflito bélico de proporção mundial. E o assassinato de João Pessoa? Quem diria que um assunto de caráter estritamente pessoal envolvido em uma uma rixa política local iria assumir dimensão nacional e servir de justificativa para a Revolução de 1930, mudando completamente o eixo histórico do Brasil? Pois é! A História tem os seus caprichos. E se existe uma história caprichosa – e diria MARAVILHOSA! – é a história do Brasil, que o brasileiro, em geral, infelizmente, não conhece. Sugiro o canal do Eduardo Bueno no YouTube. E o momento que vivemos atualmente é um desses caprichosos episódios da história nacional, no qual, talvez, o presidente Jair Bolsonaro não seja o protagonista, mas sim o Supremo Tribunal Federal e o Sistema Judiciário, em tese, o último baluarte da República, que parece estar ruindo como uma casa velha. A minha esperança é a minha própria percepção, como diz o Eduardo Bueno, de que as forças armadas brasileiras são, essencialmente, legalistas. Mas seria viajar demais se sintetizasse uma ruptura em dois nomes: Janot e Gilmar?
Então a viagem é a seguinte: Rodrigo Janot cometeu a besteira de narrar e reiterar um devaneio pessoal e intransferível, que foi a intenção de assassinar o ministro Gilmar Mendes com um tiro de pistola na cara e, em seguida, se suicidar – provavelmente com um tiro na boca, de baixo pra cima, de modo a estourar-lhe o cérebro. Tudo isso na antessala do plenário do Supremo. Foi o que entendi!
Tal narrativa deu azo para que Gilmar requeresse ao colega Alexandre de Moraes uma batida nos endereços de Janot, a suspensão do seu porte de arma e a apreensão da própria pistola, possivelmente a que seria usada no não concretizado crime premeditado. Agora: não encontrei perdido entre os artigos do Código Penal Brasileiro a tipificação da conduta de intencionar matar alguém, com a qualificadora de total e completa ausência de materialidade. Ou seja: o Rodrigo Janot está sendo indiciado num inquérito que investiga ataques e fake news contra o STF porque – num esforço de imaginação – em entrevista para promover o seu livro, citou um trecho em que narra ter colocado na cintura uma pistola carregada e por muito pouco não a descarregou numa autoridade de língua ferina, por ter feito graça com a sua filha advogada. Só faltou dizer, no livro, que a autoridade de “língua ferina” também era “uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia”. Mas resolveu isso numa entrevista na qual nomeia Gilmar Mendes.
Aí fico imaginando um evento em que estivessem reunidos todos os brasileiros natos, naturalizados e residentes – incluindo eu, o leitor, Janot e Gilmar, claro. Apaga-se a luz por cinco segundos, durante os quais ouve-se um estampido. Quando acende a luz lá está Gilmar Mendes estatelado no chão com um tiro na cara. Fica o enigma: “Quem matou Gilmar Mendes?” Rodrigo Janot? Eu? Você, leitor? Luis Roberto Barroso? Joaquim Barbosa? Todos somos brasileiros, portanto, todos estamos na hipotética reunião. Mas acho que sobraria pro Janot, porque foi o único que revelou publicamente sua intenção.
Deixando as pilhérias de lado, comentei na postagem dum amigo numa rede social sobre a ação da Polícia Federal nos endereços de Janot por determinação de Alexandre de Moraes. Digo que se tratou de pura demonstração de poder. A intenção não exteriorizada foi em 2017, portanto, a cerca de dois anos. Ninguém teria ficado sabendo, se Janot não tivesse colocado em seu livro e depois, na entrevista, dado nome ao boi. Qual risco proporciona a Gilmar ou a qualquer outro membro da Suprema Corte hoje em dia? Evidentemente que nenhum! Se realmente quisesse matar Gilmar já o teria feito. Quem quer fazer faz, não fica falando. Quer matar? É só apertar o gatilho. E se no inquérito Janot disser que tudo não passou de um delírio literário? Mas que agora sente vontade de mandar flores pro Gilmar, bater na porta do Lewandowski e desejar bom dia?
Desviei o roteiro do texto. A intenção inicial era concluir dizendo que a batida nos endereços do Janot tem a verdadeira intenção de encontrar documentos, impressos ou digitais, que poderiam comprometer alguns ministros do Supremo, ou ainda, evidenciar ilegalidades na Lava Jato, tipo: arquivos confidenciais. E a revelação de tais documentos poderia, em última hipótese, anular decisões do então juiz Sérgio Moro, ou incriminar alguns ministros – cinco, talvez?. Tudo isso misturado poderia causar uma reação popular radical, e das nossas forças armadas, não em forma de intervenção direta, mas na simples aposentadoria compulsória de alguns dos ministros do Supremo. Há antecedentes desta modalidade de ação e reação. É só lermos a nossa história recente.