Desde as últimas segunda e terça-feira os roraimenses têm se debatido contra a decisão prévia do presidente Jair Bolsonaro em não fechar as fronteiras do Brasil com a Venezuela e Guiana, por força da pandemia do COVID-19. No final da terça-feira, afinal, o chefe do Executivo federal decidiu pelo fechamento parcial da fronteira com a Venezuela, liberando apenas para o tráfego de mercadorias. Contudo, ao que pudemos avaliar das notícias divulgadas na imprensa nacional e local, apenas a fronteira com a Venezuela foi parcialmente fechada, ficando para livre trânsito a fronteira com a Guiana, que também deve ser fechada. Isto demonstra mais uma vez o que diz a canção interpretada por Elis Regina – que, aliás, ontem estaria completando 75 anos: “O Brasil não conhece o Brasil”.
Ao que nos ficou demonstrado, nem o presidente da República, nem a sua equipe, conhecem a realidade geodemográfica do Estado de Roraima. Têm notícias, sim, do que vem ocorrendo na Venezuela, nos últimos anos, sob a ditadura Maduro. Mas não sobre a verdade real das fronteiras brasileiras, sendo este um dos efeitos colaterais do Distrito Federal, o centro do poder nacional, estar situado no meio do planalto central: longe de tudo!! Brasilia me lembra uma enorme fortaleza, um Kremlin – que significa fortaleza. Ou um Palácio de Versalhes, longe do povo, longe da vida cotidiana na nação.
Além da fronteira com a Venezuela, a fronteira com a Guiana também deveria ser fechada, uma vez que, diariamente, ali cruzam centenas de imigrantes cubanos, haitianos, guatemaltecos, nicaraguenses, imigrantes de origem islâmica e… venezuelanos! Além disso, muitos chineses têm lojas em Lethem, cidade fronteiriça com o Brasil, que, juntamente com familiares e funcionários, mantém livre intercâmbio com a China. O agravante destes imigrantes, pois, em relação aos venezuelanos, é que estão de passagem pela Guiana, tendo cruzado vários países centro e sul americanos, e até do horiente.
Em Roraima nós temos um gravame: as populações indígenas que habitam, maioritariamente, na área de fronteira. Todos nós sabemos que os indígenas têm baixa imunidade para vírus da ordem do COVID-19. Fico devendo a informação quanto ao número de leitos hospitalares existentes hoje no Estado de Roraima, mas esse número se concentra na capital, Boa Vista, alertando que, dos leitos existentes, já quase não há disponibilidade nos dois principais hospitais – Hospital Geral e Hospital das Clínicas, assim como, no Hospital da Criança Santos Antônio – uma vez que as unidades atendem, além das demandas da população residente, os imigrantes venezuelanos que, diariamente, entram às centenas no Estado, os imigrantes que entram pela Guiana, e ainda os indígenas, que não têm unidades de saúde próprias. O resultado dessa matriz é o caos permanente nos sistemas de Saúde de Roraima, tanto estadual, quanto municipais. Agora, imagine o leitor, este mesmo quadro acrescido das vitimas do COVID-19 na Venezuela e Guiana, dois países pobres e que não dispõem da mínima estrutura para controle e atendimento da sua população: onde irão procurar recursos da Saúde aquelas vítimas graves da infecção viral? Claro que virão direto para o nosso quase paralítico sistema de Saúde.
Propomos, então, medidas de atendimento na própria fronteira, com hospitais de campanha e postos móveis de atendimento, envio de remédios, equipamentos e material médico-hospitalar para a Venezuela, para que o seu próprio sistema da Saúde atenda aos seus cidadãos.
Por fim, ao que pudemos concluir, apenas as fronteiras do Brasil com a Venezuela, Guiana e Uruguai (não sei quanto ao Suriname) permanecem abertas. Com os demais países estão fechadas ou parcialmente fechadas: Guiana Francesa, Colômbia, Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina. Todos com domínio da soberania nacional. E o Brasil? Ao que o presidente da República tem se pronunciado, o Brasil não tem mais tal prerrogativa, em face da Lei de Migração e os inúmeros tratados internacionais consignados ao longo das últimas décadas, embora o Congresso Nacional tenha aprovado a Lei nº 13.979/20.