O título deste artigo resume tudo. O Brasil nunca foi um país pacífico, engana-se quem assim pensa. Quem quer a volta da ditadura militar? Engana-se quem imagina que isso vai resolver. Será apenas o retorno de uma prática constante em toda a história nacional: os militares concorrendo com o estamento burocrático. Regimes não democráticos têm sido a regra. Os períodos de democracia são exceção. E nunca se viveu um período tão longo como o atual. Em todo caso, corrupção sempre existiu, sempre houve patrimonialismo e clientelismo, herança dos nossos fundadores. Há tempos queríamos escrever algo parecido com este artigo, mas nos faltava tempo e disposição para elencar cronologicamente os fatos históricos, o que nos foi poupado por uma mensagem anônima de WhatsApp que me foi repassada pelo amigo Edson Paiva, a qual compartilhamos integralmente com o leitor ao final do post.
Vamos tomar a partir do marco inicial estabelecido pela história oficial: 22 de abril de 1500, o descobrimento. Começava um período colonial que iria até 16 de dezembro de 1815, quando o Brasil assume o status de reino unido de Portugal e Algarve, tendo continuado nesta condição, em regime absolutista, até 07 de setembro de 1822, com a declaração da independência pelo príncipe regente D. Pedro, coroado Dom Pedro I, imperador do Brasil. Também foi um regime centralizado pelo monarca, que durou até 1840, quando Dom Pedro II dividiu a estrutura do governo em poderes Legislativo, Executivo, Judiciário, e o Poder Moderador, que era ele próprio, o soberano.
Em 1847 Pedro II criou o Conselho de Ministros, inspirado no Parlamento britânico. Só que na Inglaterra o rei reinava mas não governava, enquanto no Brasil o imperador era o chefe de Estado e delegava a chefia do governo ao presidente do Conselho de Ministros, correspondente ao primeiro-ministro britânico, chefe do poder executivo, que aqui era da livre escolha do monarca, cabendo a este presidente do Conselho nomear os demais ministros, e estes passavam pela aprovação do parlamento. Em caso de desavenças entre o parlamento e o presidente do Conselho, o imperador, enquanto chefe do Poder Moderador, poderia dissolver o parlamento e convocar novas eleições, que eram censitárias e restritas aos homens, ou seja: apenas os senhores detentores de bens tinham direito a voto, e só para a Câmara, pois o Senado era decisão pessoal do imperador, que escolhia cada senador representante de província entre uma lista tríplice. Foi o que mais perto chegamos de democracia no período imperial.
Proclamação da República
Enfim, em 1889 é proclamada a República! – contra a vontade popular. Um golpe militar. Nomeado primeiro presidente o velho e doente Marechal Deodoro da Fonseca, que bradara o simbólico grito da proclamação. Sem eleição direta ou indireta, governou por pouco mais de dois anos, entre 15 de novembro de 1889 a 23 de novembro de 1891, sucedido pelo seu vice, Floriano Peixoto, também militar – o Marechal de Ferro -, que governa até 15 de novembro de 1894, completando o mandato do governo provisório, também conhecido como República da Espada, caracterizado pela eclosão de vários focos de resistência ao regime militar e apoio ao imperador para a volta da monarquia. Floriano respondeu com forte repressão. Houve ainda várias rebeliões entre os próprios militares, neste período. Em seu livro “A Ditadura Encurralada” (Companhia das Letras, 2004, p. 206) Elio Gaspari narra a respeito de Floriano Peixoto:
“Reprimindo a revolta da Armada e a insurreição federalista de 1893, suas tropas levaram ao pelotão de fuzilamento um marechal-barão e dezessete oficiais da ativa. Em combate, mataram um almirante.”
O primeiro presidente eleito pelo “voto direto” foi Prudente de Moraes, representante da oligarquia cafeicultora paulista. É o início da política dos governadores, da qual derivaria a política do café com leite -, caracterizada pela alternância entre um presidente mineiro e um paulista. Com todos os entraves registrados nos livros de História do Brasil – voto de cabresto, fraude, etc. -, tal período “democrático” com eleições “diretas” termina com a Revolução de 1930, levando ao poder Getúlio Vargas, que fica até 1945, quando é substituído por um governo provisório – portanto, some-se mais 15 anos de regime de exceção sob a cartola de Vargas.
Com a posse de Dutra (Eurico Gaspar Dutra) em 31 de janeiro de 1946, eleito pelo voto direto, tem início um período de 16 anos de democracia, que vai até 31 de março de 1964, com mais um golpe militar, que mais uma vez tinha o intuito inicial de “organizar a casa” e depois devolver o governo aos civis em relativo curto espaço de tempo, como já acontecera diversas vezes, pois no 15 de novembro de 1889 as forças armadas resgatam para si o papel de poder moderador do segundo império. A nossa narrativa aqui é breve e corrida, mas é corriqueira a intervenção militar na nossa história, vide o resumo ao final. Mesmo no período 1946-1964 houve diversos entreveros neste sentido.
Mesmo crendo na sincera intenção de Castelo (Marechal Castelo Branco) em devolver as rédeas aos civis, os homens de verde-oliva se afeiçoaram ao poder e 1964 marca nova ditadura que vai até 15 de março de 1985 – mais de 20 anos -, quando toma posse José Sarney, vice-presidente de Tancredo Neves, que morre antes de assumir, eleito pelo voto direto. São, portanto, cerca de 33 anos de eleições diretas. Democracia, propriamente dita, não podemos dizer que foi plena, pois o voto comprado, campanhas eleitorais financiadas pela corrupção, maculam o processo eleitoral, destronando a democracia do mundo ocidental contemporâneo.
Mas com toda a corrupção, a “safadeza” dos políticos civis, em parceria com o eleitor que conscientemente vende o seu voto por poucos reais ou em troca da garantia da manutenção de kites bolsa miséria, e ainda os “empresários” formadores de uma classe que não se pode chamar de burguesa, sob pena de ofender a verdadeira burguesia que se formou a partir de muito trabalho e renúncias pessoais, ao longo dos séculos… apesar de tudo isso, devemos primar pela verdadeira democracia participativa, na qual o eleitor não é apenas coadjuvante, mas autor e diretor da cena, cabendo-nos, a nós todos: o autor, o leitor, e a todos os demais cidadãos, propagar essa verdadeira consciência cidadã. A consciência de que o Estado existe porque nós financiamos a sua existência, e de que o deputado, o vereador, o prefeito, governador, senador, presidente da República, são servidores públicos, e não hierarcas com poder absoluto. São delegados por nós, através do voto direto.
O momento vivido atualmente no Brasil é o mais propício que vislumbro, em toda a nossa história, para essa conscientização a fim de atingirmos a maturidade social, pois jamais tivemos instituições tão fortemente firmadas, a ponto de afrontar os detentores de mandatos eletivos e do capital. Nunca tantos políticos com mandato e plutocratas foram pra cadeia. Jamais um ex-presidente da República tinha sido preso por corrupção. Se por um lado é uma infelicidade termos que mencionar tais fatos históricos, pelo simples motivo de que isto é o certo, é o que deve acontecer, como acontece nas democracias mais consolidadas do planeta – o Brasil não é exceção na malversação do erário -, por outro lado é uma felicidade tais registros, em face do antigo adágio: antes tarde do que nunca.
Sugiro a leitura da série de cinco livros de Elio Gaspari que compõem As Ilusões Armadas e O Sacerdote e o Feiticeiro, para que se entenda melhor o período da nossa última ditadura militar. Vemos que houve injustiça, muita injustiça, sob a alegação – procedente – de combate ao comunismo, que também propunha uma ditadura e cuja experiência no mundo revelou-se malfadada. E houver corrupção, muita corrupção, que continuou a ser protagonizada pelos mesmos atores na Nova República. Taí a Lava Jato que não me deixa mentir.
É preciso amadurecermos enquanto Nação, enquanto Povo, sabendo identificar e extirpar o populismo, o clientelismo, o patrimonialismo, elementos tão viscerais em nossa cultura. É preciso acabar com a crença em deuses – não em Deus! -, em salvadores da Pátria. É preciso chamarmos para nós a responsabilidade pelos governos que temos. Não somos vítimas, somos protagonistas. A solução não está em um homem, em A, B ou C. Precisamos apoiar as nossas instituições, esteios da República, sob pena de destruir tudo o que construímos ao longo desses 33 últimos anos. E se houver falhas institucionais, devemos denunciar, discutir, passar a limpo. É claro que quem não está satisfeito tenta a todo custo denegrir as instituições: Ministério Público, Judiciário, Polícia. É a política do quanto pior, melhor, desde que se mantenha no topo. É lamentável ver um senador da República, Renan Calheiros, insultar o Judiciário questionando como um “juizeco” pôde impor decisão sobre ele, na época presidente do Congresso Nacional. Ora, nem Donald Trump, famoso imprevisível, tomou atitude semelhante quando um juiz federal de primeiro grau suspendeu os efeitos de seu decreto sobre restrições à imigração. Esperneou mas cumpriu a decisão. Não houve crise entre o Judiciário e o Executivo estadunidense, nem houve um “jeitinho” pra deixar tudo como dantes. Lá não tem foro privilegiado.
Já não somos um país jovem e nem de jovens. Estamos no limiar da maturidade e temos que assumir tal status. Temos sangue de brasileiro derramado de Norte a Sul, de Leste a Oeste, em todos os tempos da nossa História. Mesmo agora, hoje, estamos em pleno estado de guerra civil, pois morrem neste país, diariamente, vítima da violência urbana, mais gente do que em muitos países que estão em guerra declarada. É preciso, pois, acabar com as ilusões. O Lula foi condenado pela Justiça, sob o devido processo legal e direito ao contraditório e ampla defesa? Deve cumprir pena e pronto! Acabou. Não tem brasileiro mais igual que os demais. Nem mais brasileiro do que os brasileiros.
VOCÊ ESTUDOU HISTÓRIA DO BRASIL?
Certamente em nenhuma escola te ensinaram o que se segue.
SEIS CONSTITUIÇÕES FEDERAIS
1891
1934
1937
1946
1967
1988
9 MOEDAS
Réis: até 1941
Cruzeiro: 1942
Cruzeiro Novo: 1967
Cruzeiro: 1970
Cruzado: 1986
Cruzado Novo: 1989
Cruzeiro: 1990
Cruzeiro Real: 1993
Real: 1994
SEIS VEZES CONGRESSO FECHADO
1891
1930 – 34
1937 – 46
1966
1968 – 69
1977
SEIS GOLPES DE ESTADO
1889
1930 – 34
1937 – 45
1945
1955
1964 – 85
UM PLEBISCITO IGNORADO
Venda de armas: 2005
13 PRESIDENTES QUE NÃO CONCLUÍRAM O MANDATO
Deodoro: 1891
Afonso Penha: 1909
Rodrigues Alves: 1918
Washington Luís: 1930
Júlio Prestes: 1930
Vargas: 1945 e 1954
Carlos Luz: 1955
Jânio Quadros: 1961
João Goulart: 1964
Costa e Silva: 1969
Tancredo Neves: 1985
Collor: 1992
Dilma: 2016
31 PRESIDENTES NÃO ELEITOS DIRETAMENTE (também considerando posse de interinos)
Deodoro: 1889*
Floriano Peixoto: 1891*
Prudente: 1894*
Campos Sales: 1898*
Rodrigues Alves: 1902*
Afonso Penha: 1906*
Nilo Peçanha: 1909*
Fonseca: 1910*
Venceslau: 1914*
Rodrigues Alves: 1918*
Delfim Moreira: 1918*
Epitácio: 1919*
Arthur: 1922*
Washington Luis: 1926*
Júlio Prestes: 1930*
Vargas: 1930
José Linhares: 1945
Café Filho: 1954
Carlos Luz: 1955
Nereu Ramos: 1955
Ranieri Mazilli: 1961
João Goulart: 1961
Castelo Branco: 1964
Costa e Silva: 1967
Médici: 1969
Geisel: 1974
Figueiredo: 1979
Tancredo Neves: 1985
José Sarney: 1985
Itamar Franco: 1992
Michel Temer: 2016
*Presidentes do Período da República Velha marcado pelas fraudes eleitorais e o coronelismo.
31 REVOLTAS E GUERRILHAS
Golpe Republicano: 1889
Primeira Revolta de Boa Vista: 1892-1894
Revolta da Armada: 1892-1894
Revolução Federalista: 1893-1895
Revolta de Canudos: 1893-1897
República de Curani: 1895-1900
Revolução Acreana: 1898-1903
Revolta da Vacina: 1904
Segunda Revolta de Boa Vista: 1907-1909
Revolta da Chibata: 1910
Guerra do Contestado: 1912-1916
Sedição de Juazeiro: 1914
Greves Operárias: 1917-1919
Levante Sertanejo: 1919-1930
Revolta dos Dezoito do Forte: 1922
Revolução Libertadora: 1923
Coluna Prestes: 1923-1925
Revolta Paulista: 1924
Revolta de Princesa: 1930
Revolução de 1930: 1930
Revolução Constitucionalista: 1932
Revolta Mineira: 1935-1936
Intentona Comunista: 1935
Caldeirão de Santa Cruz do Deserto: 1937
Revolta das Barcas: 1959
Regime Militar: 1964
Luta Armada: 1965-1972
Guerrilha de Três Passos: 1965
Guerrilha do Caparaó: 1967
Guerrilha do Araguaia: 1967-1974
Revolta dos Perdidos: 1976
Como pode tanta gente realmente acreditar que o país sempre foi tranquilo e só agora que está com algum distúrbio.
Vivemos em um país que sempre foi manipulado pela classe política.
Temos uma elite política corrupta, doutrinada pela liderança a deixar de lado seus pares: o povo.
Na verdade, a vontade que emana é deles próprios e das organizações que corrompem e são corrompidas por essas ratazanas eleitas por analfabetos, sem dentes e famintos.
Você pode ser um agente de transformação. Esclareça as pessoas com as quais se relaciona.